venezuela bloqueio
Foto: Germán Adolfo

Algumas situações na América Latina são emblemáticas. Por vezes, governos criticáveis acabam tendo de ser defendidos, diante de uma oposição pior ainda e o constante ataque do imperialismo estadunidense. Na escala de valores, lamenta-se a Nicarágua (com o péssimo modelo orteguista), o declínio da política doméstica na Venezuela de Maduro (o chavismo com Chávez era infinitamente melhor) e a falta de debate interno em Cuba. Sendo mais que franco. Cabem críticas aos modelos mais repressivos, é um absurdo não poder ter liberdade de organização e manifestação em alguns países, mas é indefensável qualquer postura colonialista ou de traição a soberania nacional.

Estamos acompanhando a escalada inflacionária após o início da guerra russo-ucraniana. Os contratos de comércio exterior são em parte baseados em índices especulativos, as cadeias produtivas de commodities são dolarizadas e poucos países podem prescindir do sistema trocas internacionais. O Brasil seria um destes, caso tivéssemos uma unidade interna capaz de produzir um planejamento econômico em setores estratégicos.

Os três países citados acima e não convidados pelo presidente imperial Joe Biden para a Cúpula das Américas 2022, não têm. A lógica das medidas de guerra econômica contra soberanias nacionais é prejudicar a existência das maiorias. No caso da terra de Simón Bolívar, será que as condições materiais de vida na Venezuela seriam tão árduas caso não sofresse um absurdo bloqueio econômico e uma criminosa espoliação de seus ativos internacionais?

A pilhagem da CITGO

“A CITGO Petroleum fabrica os produtos que alimentam a vida cotidiana. Refinamos, transportamos e comercializamos combustíveis, lubrificantes, petroquímicos e outros produtos industriais”. Isso consta no site oficial da empresa venezuelana que foi roubada pela justiça dos EUA. Trata-se de uma empresa gigante da distribuição de petróleo e derivados, incluindo uma ampla rede de postos de gasolina em todo o território expandido através das treze colônias.

Em janeiro de 2021 uma corte federal do estado de Delaware simplesmente autorizou a venda de ações da maior subsidiária da PDVSA, a estatal venezuelana de petróleo. O país de Simón Rodríguez está sob sanções internacionais, não podendo quitar uma suposta dívida (judicializada) de 1,4 bilhão de dólares para com a então empresa canadense Crystallex. Como a CITGO não poderia ser vendida, os gringos simplesmente a roubaram através do controle acionário.

O enredo é mais complicado do que parece. Os Estados Unidos estão punindo o governo venezuelano por haver nacionalizado o complexo mineiro estrangeiro em seu próprio território, e cuja atividade foi campeã de crimes ambientais. E a mineradora não é mais canadense, foi incorporada pelo fundo especulativo Tenor Capital, que opera na Bolsa de Nova York. A CITGO é um ativo estratégico do Estado da Venezuela (maior controlador até a pilhagem) e abriu precedentes para alegadas dívidas do Palacio Miraflores para com demais fundos e acionistas. O total desta “dívida” seria de 36 bilhões de dólares acumuladas por mais de “vinte anos”. Ou seja, o período do governo bolivariano.

Quando Cuba nacionalizou engenhos e refinarias de açúcar dos EUA, fizeram manobras semelhantes, além de incontáveis operações de sabotagem. Na Nicarágua após a derrota do tirano Anastasio Somoza em 19 de julho de 1979, Washington promoveu uma guerra terrorista em duas fronteiras (Costa Rica e Honduras) e também bloqueios e congelamentos de bens e ativos. Em 1990, com a vitória eleitoral de Violeta Chamorro (UNO), o governo Bush pai impôs a execução da dívida externa nicaragüense, cobrando os “custos da guerra” – financiada pelo narcotráfico e a CIA – contra seu próprio país.

A repetição do modus operandi imperial no caso da guerra econômica só vai se atualizando.

As sanções impostas e o roubo do ouro da Venezuela

Em dezembro de 2021, a Suprema Corte do Reino Unido derrubou a decisão da corte de apelações britânicas, recusando a devolução do ouro venezuelano para seu governo legítimo. O espantalho do Departamento de Estado dos EUA, Juan Guaidó, foi reconhecido por mais de 50 países, mesmo jamais sendo eleito para o Poder Executivo da Venezuela. Diante deste reconhecimento, Londres travou os depósitos (31 toneladas de ouro, à época valendo USD 1,95 bilhão de dólares).

Um ato de evidente provocação e cerco econômico, tal como no caso CITGO.  As agressões mais antigas vêm dos EUA, se trata de um conjunto de sanções promovidas por governos republicanos (Bush Jr e Trump), assim como democratas (Obama e Biden). A lista completa é bem grande e podem ser verificadas tanto no Departamento de Estado como no Departamento do Tesouro.

A título de exemplo, empresas dos EUA precisam de uma licença especial para investir ou abrir negócios na Venezuela; há proibição de empresas venezuelanas de operarem no mercado de capitais estadunidense, assim como sanções específicas contra mais de mil cidadãos do país. Ao não assinar “acordos de cooperação contra narcotráfico e antiterrorismo”, o Império proíbe a venda de material bélico para Caracas, impedindo também a comercialização de componentes patenteados pelos Estados Unidos, como os aviônicos e tecnologia embarcada em aeronaves da Embraer.

Como se não bastasse impor sua vontade contra um país soberano, ainda defendem o lobby sionista de forma direta. Vejamos:

“Em 2008, o Tesouro impôs sanções financeiras a dois particulares e duas agências de viagens na Venezuela por estarem apoiando financeiramente a organização islâmica radical baseada no Líbano, o grupo xiita Hezbollah. De acordo com a Ordem Executiva (E.O.) 13224, essas sanções referem-se ao financiamento do terrorismo.”

Deste modo, ao classificar como terrorista as forças político-militares que lideram a resistência às agressões do Apartheid Colonial contra seus territórios, a exemplo do Hezbollah libanês e o Hamas palestino, o Império quer que as populações árabes sejam simplesmente massacradas sem o direito a defesa. Enquanto sanciona a Venezuela, envia sem exigência de contrapartida mais de USD 5 bilhões de dólares anuais para Tel Aviv!

Como se não bastasse, as sanções operam com pirataria contra a maior riqueza do país e seus aliados:

“Em 2020, o Tesouro passou a punir pessoas físicas, empresas, e companhias de navegação pelo transporte de petróleo venezuelano em violação de sanções. O Tesouro impôs sanções a duas subsidiárias da estatal de petróleo e gás da Rússia empresa, Rosneft, e sancionou quatro navios estrangeiros de empresas de transporte de petróleo venezuelano. Em junho de 2020 e janeiro de 2021, pessoas físicas foram sancionadas pelo Tesouro, empresas e embarcações por evadirem as sanções.”

Qualquer semelhança com o roubo de um petroleiro iraniano em porto da Grécia, sendo a carga composta por barris de petróleo confiscados pelos EUA, não é nenhuma coincidência. A diferença é que a resposta veio, sendo dois navios tanque gregos apreendidos pela força naval persa. “Surpreendentemente” uma corte helênica reverteu decisão anterior que “autorizava” a pirataria do Império. Ou seja, a resposta plausível diante de um ato de agressão é um gesto de resistência, e para tal, os países soberanos precisam realmente estar preparados.

É importante manter a solidariedade com todos os países que sofrem atos de sanções e sabotagem econômica. Precisamos buscar, a partir da América Latina, saídas de arquitetura financeira que possam viabilizar operar o comércio entre nossos países, ou de nosso Continente para outras regiões do planeta.

A guerra contra a economia da Venezuela, independente das necessárias críticas ao governo Maduro, é um ato permanente de agressão imperialista e como tal deve ser combatida.


 

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