domingo, abril 28, 2024

“Uma espécie em perigo”: a geopolítica do clima e a COP 26

“Uma importante espécie biológica corre o risco de desaparecer devido à rápida e progressiva liquidação de suas condições naturais de vida: o homem.” Assim iniciou o discurso histórico de Fidel Castro Ruz na chamada “Cúpula da Terra”, realizada na cidade do Rio de Janeiro em junho de 1992. Palavras que são sábias para o que é justo e ainda mais sábias para o que é antigo, pronunciadas há quase exatamente duas décadas à frente dos representantes das Nações Unidas. Apesar do cenário radical exposto pelo líder cubano, nada parece mover a letargia egoísta das elites políticas e econômicas globais. A exposição do chanceler de Tuvalu – veja a fotografia que ilustra este material – seria risível se não fosse trágica. Uma pequena nação no arquipélago da Polinésia expressa seu desespero com o aumento do nível das águas globais, que literalmente ameaça sepultar seu país nas profundezas do Oceano Pacífico. Realidade que poderia parecer extrema e distante não fosse o fato de que várias cidades litorâneas da América Latina e ilhas do Caribe sofrerão o mesmo dilema dos tuvaluanos nos próximos anos. Entretanto, as contradições insolúveis do sistema predominante são atualizadas com o pano de fundo da emergência climática. Às teses que enfatizam o “caráter democrático” do clima e seus impactos, o capital responde com a estratificação de nações e pessoas: não só a contribuição para as emissões de gases de efeito estufa é desigual, mas também os riscos e custos enfrentados pelas classes dominantes e dominadas, pelos poderes centrais e pelos países periféricos. Se por um lado alguns dos maiores capitalistas sonham em colonizar outros planetas e abandonar uma terra descartável para eles, se dispara a cifra, hoje recorde, de refugiados e refugiadas atingidos pelas mudanças climáticas.  Mas os debates e mobilizações gerados em torno da COP26 trazem outra questão para o primeiro plano: A inevitável gravitação da geopolítica em um mundo cada vez mais disputado, também na dimensão ecológica. A corrida pela hegemonia global, ou pelo menos pela construção de um cenário multipolar, considera o clima como mais uma variável do momento e instrumentaliza os discursos e práticas em torno da ecologia e das mudanças climáticas. Por trás dos apelos a uma humanidade em abstrato, aparecem interesses particulares e correlações de forças. Mas enquanto a locomotiva da história salta rapidamente as estações que mergulham na distopia ecológica, a espécie humana – parafraseando Walter Benjamin – busca “puxar” o freio de mão. Felizmente, das antiquíssimas resistências dos povos indígenas e camponeses às mais recentes mobilizações da juventude, dos movimentos sociais aos intelectuais críticos, entram em jogo velhas e novas sensibilidades ecológicas que demonstram o desejo inalienável de chegar às gerações futuras, a mesma casa, o mesmo jardim que recebemos.  Ainda nas palavras de Fidel Castro, é quase tarde, mas não completamente. Após a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas realizada em Glasgow, a ALAI apresenta o seu Dossiê “Uma espécie em extinção: a geopolítica do clima e a COP26”, que corresponde ao mês de novembro de 2021. Com o objetivo de fazer um primeiro balanço do conclave principal sobre questões climáticas, e compartilhar a enorme riqueza e diversidade de alternativas e soluções,  para tornar visível a agenda ecológica e climática dos sujeitos e organizações populares. Oferecemos uma série de artigos, análises e notas de opinião publicadas em espanhol, inglês e português, e produzidos em latitudes tão diversas como as de  Argentina, Brasil, México, Estados Unidos, Índia, Bangladesh, Malásia, Holanda e Bélgica.